quarta-feira, 20 de abril de 2016


A escova de dente vermelha

Foi uma questão de horas para a tragédia anunciada. Passando por Colatina/ES, a trabalho num momento de estarrecimento resolvi ir até o Rio Doce que de longe já me causava espanto pelos seus bancos de areia imensos.

Havia dias, semanas queria ir até a margem do rio, passava pelas cidades que o margeiam no espírito santo e cada dia aquela secura e areias sem fim me incomodava mais e mais. O rio com certeza já estava semimorto há anos.

Por fim encontrei uma escadaria de alvenaria que tinha ao lado uma régua de marcação do nível de águas e me veio a mente a enchente do final de 2013 para 2014 onde as águas subiram tanto que invadiram a cidade, além de outras. Contudo a seguir a seca instalou-se ao ponto de ser proibida a captação de água para as roças.
Desço a escadaria e vejo a sujeira urbana milhares de coisas descartadas pelas margens e um objeto me chama atenção; uma escova de dente vermelha incrustada na terra seca do leito esturricado. Fotografei a tal escova de dente sem ter a menor noção de que horas depois lá em Minas a barragem de Mariana por descaso criminoso da SAMARCO/VALE se romperia dando início a tragédia que hora já conta com mais de cinco meses.

Fica a tragédia, ficam as vítimas de suas próprias ignorâncias e descasos com o meio, ficam as toneladas de produtos altamente tóxicos despejados e negados pela mega empresa sanguessuga e covardemente escondida pela briosa Marinha em seu relatório secreto. Fica o desvalor a vida, inclusive humana.

Que meleca! Nada a fazer, nada há a fazer.

Penso que essa minúscula prova da nossa incompetência deveria servir de ferramenta de porte obrigatório a cada cidadão e principalmente aos moradores da região do desastre em toda a sua extensão, cada um deveria ter que resgatar os milhares de escovas de dente descartadas como lixo, nos lixões, as margens do Rio Doce e todo santo dia deveriam ter que cumprir horário de escovamento do leito do Rio, e os donos das SAMARCO/VALE que insistem em dizer, declarar e até publicar matéria paga que não existem componentes tóxicos, e os engenheiros responsáveis e funcionários deveriam também ser municiados com escovas de dente para que cada um revertesse esse sacana desmoronamento de valores, prioridades e barro contaminado, até o dia que por fim tudo fosse limpo novamente e a flora restaurada e fauna reimplantada e vida preservada.

Utopia? Guardado o devido exagero aqui passionalmente escrito e condenação proposta já foi possível reverter desastres ambientais mundo afora, porque aqui não?


Segue a fotografia que fiz da escova de dente vermelha que me arrependo não ter desincrustado do leito do rio e pego pra eu começar o meu trabalho de limpeza, 

A minha parte.


Nenhum comentário: